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Anna Kariênina

Li e reli Anna Karenina há algum tempo. Quando realmente gosto de um livro, leio, volto, releio sem pudores ou preguiça. Os temas: ciúme, fé, fidelidade, família, casamento, sociedade, progresso, desejo carnal, o campo, a cidade, e a paixão são evocados nesse livro e Tolstói carrega nas tintas do espiritualismo.

Um pouco sobre o autor...

Antes de falarmos sobre o romance “Anna Karenina” é necessário falar um pouco sobre : Leon Tolstoi. Sobre ele podemos dizer que recebeu herança de uma das famílias mais antigas na Rússia. Sua educação acadêmica e cultural seguiu o rígido e tradicional padrão do século XVIII. Uma de suas particularidades sempre foi a auto-análise acentuada.

Em 1844, Leon freqüentou a Universidade de Kazan. Muito cedo ele mostrou um desprezo para o aprendizado acadêmico, mas se interessou o suficiente na faculdade de Direito (o melhor caminho de estudo) para freqüentar as aulas com alguma regularidade. A Universidade de Kazan, próximo a São Petersburgo, em Moscou, foi um grande centro social para a classe superior. Depois de formado, passou um período em Moscou e logo se alistou na guarnição do Cáucaso, seguindo seu irmão Nicolai, oficial do exército russo.

Em 1856, após abandonar a carreira militar, Leon Tolstoi passou a viver em sociedade, ampliando suas relações pessoais. Viajou à Europa, visitando diversos países. Ao regressar, isolou-se em sua propriedade rural, determinado a dedicar-se à literatura. Casou-se nesse período com Sofia Bers, com quem teve nove filhos. O objetivo fundamental da natureza de Tolstoi era a busca da verdade, para dar sentido da vida, aos objetivos finais de arte, à felicidade da família -e a Deus. No casamento, sua alma encontrou uma liberação desta busca incessante, e uma vez se aproximando de seu ideal de felicidade de família, Tolstoi entrou no maior período criativo de sua vida.

Em 1865, iniciou a elaboração de "Guerra e Paz", uma das maiores obras literárias de todos os tempos. Trata-se de um extenso romance que aborda as guerras napoleônicas e traça um quadro da sociedade russa do século 19.

Em fins da década de 1866, Leon Tolstoi escreveu "Anna Karenina", que também obteve grande repercussão. Aos poucos, suas inclinações se voltaram para a religião. Leon Tolstoi se tornou pouco a pouco um cristão evangélico, uma espécie de apóstolo, pregando para os seus. Ao renegar a religião ortodoxa, acabou excomungado pela Igreja. Quando escreveu “Anna Karenina”, Tolstoi entrou em crise prolongada. Para ele, o sentido da vida consistia em viver em função de uma "bondade interior", concluiu. Somente através do compromisso emocional e religioso se poderia descobrir esta verdade natural. Ao interpretar os Evangelhos, Tolstoi descobriu que toda a mensagem de Cristo estava contida na idéia de que “vós não resistais ao mal”. Essa doutrina da "não-resistência" se tornou a base de Tolstoi: um sistema de idéias em que se prioriza viver de acordo com a natureza, renunciando aos refinamentos artificiais da sociedade.

Suas posições políticas também se radicalizaram, tendendo ao anarquismo. Tolstoi criou uma escola alternativa para a qual chegou a redigir os livros didáticos. Suas convicções cada vez mais exaltadas atraíam a atenção de místicos do mundo inteiro. Ao mesmo tempo, ampliava-se sua fama de grande romancista.

Distanciando-se cada vez mais de sua família, Tolstoi decidiu entrar para um mosteiro. Planejou a fuga e, no dia 31 de outubro de 1910, finalmente embarcou num trem, acompanhado apenas da filha Alexandra e de um criado. Com a saúde abalada, foi obrigado a descer na cidadezinha de Astapovo, sendo acolhido pelo próprio agente da estação.

O fato tornou-se público e telegramas e visitas começaram a chegar de toda a Rússia e de outras partes da Europa. Leon Tolstoi resistiu apenas alguns dias, falecendo pouco depois.

E agora, vamos ao romance.

O romance começa com a crise na família Oblonsky quando Dolly, sua mulher, descobre que seu marido tem uma amante. Anna Karenina, irmã de Sr. Oblonsky, chega para reconciliar o casal e dissuade Dolly de obter um divórcio. Ele tinha um caso amoroso com a governanta dos seus filhos, e ela estava ameaçando deixá-lo. Anna é casada com um destacado oficial em São Petersburgo, e circula nos mais altos círculos da sociedade russa, com a reputação de ser uma mulher charmosa e invejada por sua beleza.

Quando Oblonsky vai à estação de trem para encontrar Anna, ele encontra um certo tenente Vronsky, que está esperando por sua mãe que chegaria no mesmo trem. Eles descobrem que Anna e a mãe de Vronsky viajaram na mesma cabine, e sua mãe gostou muito de Anna. Assim, Vronsky tornou-se fascinado pelo espírito e vitalidade de Ana. Antes que eles deixassem a estação, um guarda ferroviário é atropelado e morto por um trem que estava passando. Diante dos apelos de Anna, Vronsky deixa 200 rublos para a viúva do guarda.

No mesmo dia, Oblonsky encontra seu amigo, Constantine Levin, que acaba de chegar de sua propriedade rural. Levin é um proprietário de terras, socialmente desajeitado, mas de coração generoso, ele é intelectual e filósofo, mas destina o seu pensamento para questões práticas como a agricultura. Ele pretende ser sincero e ter uma vida produtiva em tudo que faz, e se demite do seu cargo no governo local, porque ele a vê como algo inútil e burocrático. Levin é uma figura de proa na novela. Ele está na cidade para ver a cunhada de Oblonsky, Kitty Shcherbatskaya, pois Levin está muito apaixonado pela jovem de dezoito anos. Oblonsky sugere um encontro com Levin mais tarde naquela mesma noite em um parque, onde Kitty costuma patinar no gelo.

Levin vai ao parque. Eles patinam juntos e flerta intensamente com ela, mas ela demonstra sinais contraditórios. Durante o jantar com Oblonsky, naquela noite, Levin descobre que tem um rival no amor de Kitty: o conde Alexis Kirilovich Vronsky. E, de fato, quando Levin se declara a Kitty, ela o rejeita, esperando que Vronsky faça sua proposta em breve.

No baile da noite seguinte, Kitty nota que Vronsky está distraído e desatento a ela. A fonte da sua distração fica clara quando ela observa Vronsky dançando uma valsa com Anna. Os dois estão completamente apaixonados, e o coração de Kitty fica despedaçado. Ela percebe que suas esperanças estão acabadas; Vronsky nunca quis se casar com ela.

A desilusão amorosa de Kitty Shcherbatskaya acaba se manifestando em sintomas físicos. Sua família decide mandá-la para uma estação de águas na Alemanha para que ela recupere sua saúde. A desilusão amorosa de Kitty acaba se manifestando em sintomas físicos. Na estação de águas, na Alemanha, Kitty conhece Varenka, uma jovem e piedosa mulher. Kitty tenta imitar seu senso de profunda espiritualidade e ser caridosa como a jovem. Ela não consegue atingir o mesmo tipo de compreensão com os menos afortunados que Varenka tem, mas passa a se conhecer um pouco melhor quando ela deixa a estação de águas.

Levin a visita, e Dolly sugere que ele proponha casamento a Kitty novamente. A sugestão embaraça Levin. Mas quando ele revê Kitty alguns dias mais tarde, ele percebe que ainda a ama. Kitty dá a entender que ela aceitaria se Levin propusesse o casamento novamente. Ele o faz, e eles começam a planejar o casamento.

Na sua volta para São Petersburgo, Anna começa a circular mais freqüentemente nos ambientes onde está certa de encontrar Vronsky. Ela diz a mesma que gosta da atenção de Vronsky, mas logo admite para si que os sentimentos dele constituem a paixão da sua presente existência. O comportamento de ambos rapidamente atinge o reino do socialmente inaceitável.

Karenin, marido de Anna é um homem extremamente preocupado com as aparências, e por essa razão ele confronta Anna. Ela desdenha de sua preocupação, e o casal prontamente se afasta um do outro. Vronsky e Anna consumam seu amor.

Em São Petersburgo, o caso de Vronsky e Ana torna-se rapidamente conhecido. A sociedade local está aguardando ansiosamente pela derrocada de Anna, e a família de Vronsky está ficando preocupada que este romance esteja o impedindo de progredir na sua carreira.

Karenin, marido de Anna, sofre sob as humilhações da opinião pública e uma carreira estagnada. Sua única amiga é a Condessa Lydia Ivanovna, que o encoraja a juntar-se a ela em seu cristianismo emocional. Quando retornam a São Petersburgo, Ana e Vronsky são recebidos com a infeliz notícia de que foram colocados à margem da alta sociedade, especialmente Anna.

E agora, como essa história toda vai terminar? Bem, não serei eu aquele que contará todas as felicidades e tristezas, cabe ao leitor ter a coragem de ler as muitas páginas desse ótimo romance. E vou para por aqui para que você leia.

"Anna Karenina" é um romance psicológico no qual o uso do "monólogo interior" de todos os personagens é constante. Cada personagem principal, através do auto-discurso, expõe sua vida interior recapitulando suas motivações, suas experiências anteriores, seus planos para o futuro. O monólogo interior dá definição verbal para os processos semi-articuladas de consciência dos personagens nesse romance.

Outro ponto que merece ser observado neste romance formidável é a descrição que Tolstoi nos oferece dos padrões de casamento sem esperança, na sociedade urbana. Apesar de exibir a união feliz de Kitty e Levin, Tolstoy, em última análise, afirma que os casamentos baseados apenas no clamor do sexo enfraquecem a busca do indivíduo para a "bondade imanente".

Enquanto Tolstói escreveu Anna Karenina, no entanto, ele ainda exultava com o sucesso de seu próprio casamento. O casamento é um compromisso, porque a família representa parte integrante de sua busca da realidade essencial. Seus interesses externos e seu amor são veículos que ajudam a descobrir a verdade da bondade interior.

Se em "Guerra e Paz", Tolstoi dá atenção especial para as forças da consciência de massa e mudança cultural em um contexto histórico, ‘Anna Karenina’, em um nível muito mais íntimo, ilustra as forças que permitem aos indivíduos enfrentar os desafios. Eles devem superar a crise e a estagnação com o compromisso ou então sucumbir.

Concupiscência carnal, vestuário ornamental, alimentar fantasias são outros sintomas da influência corruptora da civilização. De acordo com suas crenças, Tolstoi renunciou a todos os direitos autorais de suas obras desde 1881, repartiu sua propriedade entre os seus familiares e vestido de camponês, comia apenas vegetais. Desistiu de bebidas alcoólicas e tabaco, envolvidos em trabalho manual e mesmo em aprender a fazer as suas próprias botas. Renunciando a arte criativa de seus refinamentos corruptos, Tolstoi escreveu trechos polêmicos e contos que incorporavam a sua nova fé.

Enquanto Anna é a figura central e simbólica da história, Konstantin Levin é o seu herói. Anna e aqueles ao seu redor derivam sua experiência de vida dos padrões altamente desenvolvidos da civilização urbana, enquanto Levin é um produto das circunstâncias menos rígidas e individualistas que fazem parte das origens primais da Rússias. Seus valores derivam de sua ligação profunda à propriedade ancestral, enquanto Anna depende de seu papel social como uma dama da alta sociedade. Apesar de suas origens opostas, ambos os protagonistas buscam um significado mais profundo para a vida além das restrições definidas pela sociedade contemporânea. Anna e Levin procuram o amor como sua essência de vida. Mas como veremos, por caminhos diferentes.

Enfim, em “Anna Karenina”, encontramos um Tolstoi extremamente crítico aos padrões sociais da época e que nos coloca diante de personagens que estão dispostos a viver, amar e buscar o amor e suas verdades pessoais.

Um clássico é uma história que atravessa o tempo. E mesmo com sua linguagem datada, os dramas e as escolhas pessoais de seus personagens nos fazem refletir acerca do que existe de mais complexo e mais envolvente – as relações humanas dentro do mundo que criamos ou somos obrigados a viver.

Anna Karenina é um clássico universal, uma obra que deve ser lida. E merece um lugar na sua estante e entrar para a lista de seus melhores livros.


Data: 08 agosto 2016 | Tags: Romance


< Antes de dormir Todo dia me atiro do térreo >
Anna Kariênina
autor: Liev Tolstói
tradutor: Rubens Figueiredo

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