Preguinho - Confissões de um Gigante
Algumas pessoas poderão me perguntar se esse blog está sofrendo uma guinada para o lado futebolístico. Eu direi não. Não que eu seja contra. Mas esse blog dedica-se particularmente a grandes escritores e suas ficções e também a biografias e arte. O livro de hoje traz um personagem real extremamente rico. A biografia de um dos maiores atletas que o Brasil já produziu em toda sua história e muito pouco conhecido. Perguntarão alguns: “Ah! Quer dizer que o seu time é Fluminense e teremos (para fazer justiça) as biografias de Casagrande, Pelé, Ronaldo, Messi, Romário e tantos outros? Não necessariamente. Até porque, Preguinho não era apenas um jogador de futebol, ele era um multi atleta. Para mim é nesse quesito que se mostra “O” verdadeiro diferencial.
Eu garanto que muitos vão se surpreender com a história de João Coelho Netto, conhecido como “Preguinho”. Para começar digo que Preguinho é filho de um gigante de nossas letras um senhor conhecido como Henrique Maximiano Coelho Netto, escritor maranhense contemporâneo de Machado de Assis e fundador da cadeira número dois da Academia Brasileira de Letras, e de Maria Gabriela Brandão Coelho Netto, uma musicista de grande talento. O que chama a atenção é que esse atleta é filho de pais famosos e de classe média que tiveram todos os filhos ligados ao esporte. Alguns com certa justiça poderão dizer: e o que isso tem demais? Antigamente os ricos praticavam esportes e os pobres, não. Mas não é bem assim. Há um diferencial que iremos mostrar ao longo dessa resenha dessa biografia espetacular.
Uma delas é um traço que destaco a todos que admiro. A obstinação. Sei que no esporte há muitos obstinados, mas havia outra qualidade que era a humildade. Ao contrário do que vemos hoje, jogadores com seus carrões e com cartões de créditos de todos os bancos. Preguinho sempre se recusou ser um atleta profissional, permanecendo como amador mesmo após a profissionalização.
Mas, provavelmente, essa opção pode gerar algum tipo de deboche do tipo: “ bem , se o cara recusou-se a ser um atleta profissional, torna-se claro que o menino prodígio era bancado pelo papai e pela mamãe, não é?” Nem de longe. Preguinho trabalhava como estoquista na Casa Mayrink Veiga, entrava às sete da manhã e largava às sete da noite, no Centro do Rio de Janeiro. Seus patrões vieram saber que seu funcionário era um atleta depois de verem estampadas em manchetes que o nosso garoto prodígio havia sido campeão anfíbio (natação e futebol).
Seus empregadores perplexos perguntaram “como você conseguiu essa façanha trabalhando aqui em horário integral?” O moleque Preguinho respondeu: “acordava às quatro e meia da manhã, fazia exercícios até às seis e quarenta e cinco e vinha correndo para o serviço”.
Seus patrões, que até então só vieram saber do grande feito através das manchetes de jornais, perguntaram se ele não gostaria de chegar mais tarde ao trabalho e Preguinho com senso de justiça disse: “Não era direito sobrecarregar meus colegas de trabalho.”
Algumas histórias curiosas contadas ao jornalista Waldir Barbosa, autor dessa joia rara, aconteceram em 1925. Preguinho disputava um torneio de natação pelo Guanabara, uma prova de 600 metros, em que foi o grande vencedor e teve que sair às pressas de taxi em direção às Laranjeiras a tempo de jogar contra o São Cristovão e ganhar o título do Torneio Início.
Nascido em 8 de fevereiro de 1905. Foi atleta de futebol, vôlei, basquete, polo aquático, saltos ornamentais, natação, hóquei e atletismo. Pelo Fluminense marcou 156 gols, foi o sétimo maior artilheiro do clube e conquistou 387 medalhas e 55 títulos nas oito modalidades que praticava.
Poderia você leitor imaginar algo desse gênero nos dias atuais? Um multi atleta vencedor e que dedicou sua vida aos esportes de uma forma tão visceral.
O livro “Preguinho Confissões De Um Gigante” traz uma série de relatos emocionantes sobre esse atleta arrebatador. Um deles (e prometo que será o último, pois não quero estragar a delícia do livro contando tudo, pois essa é a vontade que dá) foi na primeira Copa do Mundo realizada no Uruguai em 1930. Fala mestre Preguinho:
“Na Copa do Mundo de 1930 só entrei por acaso, havia uma briga entre cariocas e paulistas, os jogadores paulistanos não se apresentaram para os treinos; como faltavam jogadores, completei o time de reservas, e nós ganhamos de 9 a 0 (Preguinho fez seis gols nesse jogo treino), e aí aconteceu o inesperado: alguns paulistas resolveram se apresentar, e eu ia sobrar, porém Del Debbio, beque corintiano de grande prestígio exigiu a minha presença e eu fiquei entre os titulares; quando chegamos a Montevidéu, o ambiente estava carregado, havia vários obstáculos contra nós: a torcida, o frio inclemente – seis graus abaixo de zero -, a desorganização de nosso selecionado, a falta até de técnico, pois Luis Vinhaes não havia conseguido licença em seu emprego, e diante do quadro pitoresco, formou-se uma comissão com Píndaro de Carvalho e Gilberto de Almeida Rêgo no comando do time...” (pg. 57)
Com tanto problema e desorganização do futebol e por incrível que pareça esse problema ainda continua até os dias de hoje, o Brasil perdeu o primeiro jogo para a Iugoslávia por 2 a 1, mas foi Preguinho o primeiro jogador brasileiro que marcou o primeiro gol brasileiro em Copa do Mundo. Depois o Brasil enfrentou a Bolívia e venceu por 4 a 0 com dois gols de Preguinho. O grupo do Brasil era formado por Iugoslávia, Brasil e Bolívia. Tanto o Brasil como a Iugoslávia venceu a Bolívia pelo mesmo placar. A Iugoslávia acabou classificada com maior soma de pontos.
O livro do jornalista Waldir Barbosa nascido em Maceió, Alagoas, é uma pintura, um livro que nos traz grandes recordações de uma época que poucos ainda vivos presenciaram. Um livro emocionante que nos faz comparar os valores de um tempo distante com os nossos tempos atuais. Waldir Barbosa JR, filho do jornalista, e sua esposa Waléria Barbosa fizeram um trabalho extraordinário ao resgatarem o trabalho de Waldir Barbosa, que deixou esse mundo precocemente.
Preguinho nos dias de hoje seria nome de bebida energética, disso não tenhamos dúvidas. Uma energia positiva e de uma entrega impressionante aos esportes. Uma bebida para muito poucos.
Não pensem vocês que ao lerem essa resenha podem se considerar conhecedores sobre a vida desse “olimpiano”. Você não faz ideia do que irá encontrar lendo “Preguinho Confissões de um Gigante.” Um livro que merece um lugar não apenas para os torcedores do Fluminense, mas para todos os amantes de todos os esportes. Um livro que merece um lugar em sua estante.