Noites Brancas
“Noites Brancas” refere-se ao fenômeno climático comum na Rússia, em especial São Petersburgo, onde essa história é narrada. O sol nos meses de junho e julho se põe um pouco abaixo da linha do horizonte deixando a madrugada mais clara. Faz com que as noites fiquem brancas e, realmente, para quem lê o livro, o ambiente em que essa história se passa parece esbranquiçado, claro, um pouco vazio e solitário devido às férias, quando todos viajam.
Confesso que quando acabei de ler esse livro fiquei um pouco atônito, pois sempre li esse autor expressando seu olhar obscuro e, ao mesmo tempo, ácido sobre a sociedade russa e, em particular, sobre nós humanos. No entanto, esse livro nos traz algo totalmente lírico, uma história comovente de um romantismo no sentido literal do termo.
Vamos à história? Pois bem, comecemos com a narrativa do “sonhador”. Um homem livresco que vive solitariamente sempre dialogando consigo. A história começa com o sonhador conversando com as casas de uma rua.
“As casas são minhas conhecidas. Quando caminho, é como se todas avançassem para rua em direção, olhassem para mim com todas as suas janelas e quase dissessem: “Bom dia, como vai a sua saúde? Eu estou bem, Graças a Deus, e em maio vão aumentar um andar”. Ou: “Como está sua saúde?; “Amanhã vou me reformar”. Ou: Eu quase me queimei e fiquei mesmo assustada”, etc. Dentre elas tenho as minhas favoritas, minhas amigas íntimas; uma delas deseja se tratar com um arquiteto nesse verão. De propósito começarei a passar todo o dia para que não façam sofrer de algum modo; que Deus o proteja!... Mas nunca me esquecerei da história de uma linda casinha rosa-claro. Era uma casinha de pedra tão agradável, olhava de forma tão arrogante para suas vizinhas desajeitadas, que meu coração se alegrava quando me acontecia passar pela rua e, logo que olhei para minha amiga, ouvi um grito lastimoso: “Pintaram-me com tinta amarela!” Malvados! Bárbaros! Não tiveram pena de nada: nem das colunas, nem das cornijas, e minha amiga ficou amarela como um canário...
... Agora você entende leitor, de que modo eu travei relações com toda São Pertersburgo.” (Pg. 12 e 13).
O protagonista não tem nome. É um solitário. Um homem que se isolou do resto do mundo e se perdeu em sua própria mente e sonhos. Certa noite, em uma de suas andanças, encontra uma garota muito bonita sozinha. Ela está chorando. Querendo ajudá-la se aproxima dela, mas ela vai embora. Quando um estranho aparece totalmente bêbado e a ameaça. O “Solitário” vem a seu socorro e afasta com sua bengala esse provável perigo. Ela agradece ao “Solitário” e eles rapidamente se tornam amigos e, por quatro noites e uma manhã, se encontram e conversam sobre suas vidas, amores e esperanças.
O nome dessa garota é Nastenka, e o protagonista solitário logo cai apaixonado pela beleza e também pela atenção dispensada por ela. Terei que parar por aqui fazendo algumas perguntas: o que conversaram? Qual o segredo que Nastenka guarda em seu coração? Só sei que de certa forma esse solitário torna-se um ouvinte disposto. Ele a ajuda na depressão que no momento ela está vivendo.
“Noites Brancas” é uma dessas histórias de amor que vai arrebatar a todos aqueles que apostam no amor. E vindo de Dostoievski cabem inúmeras interpretações sobre essa história de amor. A delicadeza do solitário chega a ser comovente. E você, leitor, vai se apaixonar também. Ou poderá ter uma outra versão sobre essa história.
Seja lá qual for sua interpretação, uma coisa é clara: “Noites Brancas” é um livro muito diferente de todas as obras do autor. Talvez revisando sua história pessoal em “Noites Brancas”, o autor tenha incorporado suas próprias meditações e observações sobre a vida na cidade de São Petersburgo, publicadas em um jornal em forma de crônicas e folhetins.
Dostoievski sem dúvida alguma foi “o” maior escritor de todos os tempos. Grandes escritores do nosso tempo reconhecem a sua escrita como única. Nelson Rodrigues, Woody Allen, Philip Roth e mais outros tantos se inspiraram em Dostoievski. E “Noites Brancas” é apenas mais uma grande obra desse gênio literário que merece um lugar em sua estante.