Livros > Resenhas

Pieter Bruegel

A palavra grotesco que conhecemos nos dias de hoje, perdeu a sua qualidade. Sua significação passou a ser algo como “inaudito”, “raro” e “incrível”. No entanto, o termo “grotesco” tem outra finalidade, ou seja, potencializar uma determinada situação real dando a ela algo fantástico, ou grotesco em sentido próprio, na qual o artista desconsidera qualquer semelhança com o real, dando asas à fantasia sem controle. Um exemplo que podemos dar é o inferno de Bruegel, cuja intenção é provocar risos, desgosto, surpresa sobre a ousadia de suas criações monstruosas pelo não natural e sua absurda imaginação.

Existe muito em comum entre Hieronymus Bosch e Pieter Bruegel. O segundo foi discípulo do primeiro. Bosch e Bruegel preenchem o espaço vazio com multidões de criaturas e personagens.

Bruegel retrata as atividades do dia a dia ou provérbios flamengos comuns. Bosch produz criaturas, seres humanos mudos e insultantes para qualquer espectador se sentir acolhido e envolvido com eles. Bosch e Bruegel, no entanto, compartilham muitas características em suas obras que nem sempre são imediatamente reconhecíveis. Mas fiquemos por aqui.

Bruegel mostrou a vida dos camponeses em suas pinturas, como nos quadros “A dança dos camponeses”, “Jogos de criança”, “Casamento”, entre outros. Suas diferentes versões dos quadros “A torre de Babel” também chamam a atenção.

Todo o sistema da época (leia-se a terra e as pessoas) é submetido à deformação, como, por exemplo, no quadro “Paisagem com a queda de Ícaro”. Outra tela, “A tradição do Carnaval”, resultou na Saturnália romana,  festival no qual  ocorre uma inversão: por um dia os servos e senhores trocam sua posição social, é o período em o mundo vira de cabeça para baixo e toda a rusticidade bruta da vida camponesa é celebrada em detrimento do ascetismo religioso.

A intenção de Bruegel, quando retrata o Carnaval e a Quaresma, é mostrar os extremos naturais da experiência humana; cada um na sua esfera, lugar e época. A vida contém ambos. Essa é a tendência natural da condição humana.

Sua série que fala sobre os 12 provérbios em painéis individuais é pensada para ser a primeira representação da pintura flamenga. Os provérbios em questão são de dois tipos: aqueles que mostram o absurdo da razão e de nossos comportamentos; e os provérbios mais graves, que ilustram a loucura.

O encontro com a loucura é uma das experiências básicas do grotesco. Os românticos e os modernos assumiram este tema com frequência notável. A demência e os sonhos foram utilizados para definir que o grotesco é um jogo com o absurdo.

Giorgio Vasari, ecoando Vitruvius, descreveu o grotesco da seguinte forma:

Grotescos são um tipo de pintura extremamente licenciosa e absurda feita pelos antigos, sem qualquer lógica, de modo que o peso está ligado a um fio fino que não poderia apoiá-lo, um cavalo com  pernas feito folhas, um homem tem as pernas de guindaste, com inúmeros absurdos impossíveis” (fonte: Wikipédia)

Em seu livro “O Grotesco”, Wolfgang Kayser dividiu as caricaturas em três gêneros:

1. “as verdadeiras, onde o pintor simplesmente reproduz a natureza disforme tal como a encontra”;

2. “as exageradas, onde, com algum propósito especial, aumenta a deformação de seu objeto, mas procede de um modo tão análogo como  natureza que o original continua sendo reconhecível”;

3. “ as inteiramente fantásticas, ou, a bem dizer, as assim chamadas grotescas, onde o pintor, despreocupado com a verdade e a semelhança, se entrega a uma imaginação selvagem (como, por exemplo, o assim chamado Brueghel dos infernos).” (pg 30)

Bruegel pinta o mundo cada vez mais perto da vida diária e não com a intenção de ensinar, mas apenas com o objetivo de retratar o inexplicável, o incompreensível, o ridículo, o horrível. Bruegel parece anexar uma terceira perspectiva: a do terror inspirado no insondável, que pode ser considerado também grotesco.

Podemos dizer que inicialmente o trágico abrigou o absurdo. Se passarmos pelas tragédias gregas, podemos ver a mãe matando seus filhos, podemos ver um filho assassinando seu pai ou o pai a seu filho. Mas devemos entender que todos esses atos são individuais. São atos que põem em perigo os princípios da ordem moral do mundo.

O grotesco não se preocupa com as ações individuais ou a destruição da ordem moral. No grotesco existe a incapacidade de podermos nos orientar no universo. Enquanto, na tragédia, se abre para a esfera do sentido e do absurdo possibilitando um significado mais profundo, em que o destino, os Deuses, a grandeza do herói trágico é revelada através do sofrimento.

O criador de grotesco, no entanto, não pode sugerir um significado, pois ele possui uma visão desapaixonada da vida na Terra por saber que não existe coerência no mundo.

“Pieter Bruegel”, escrito por Larry Silver, professor de história da arte na Universidade de Pensilvânia, apresenta novos insights sobre Brugel e a época em que ele viveu.

O autor (Larry Silver) coloca Bruegel no contexto social e histórico de seu tempo. Por isso, indico essa obra essencial, que merece um lugar de destaque na sua estante.


Data: 08 agosto 2016 | Tags: Arte


< Hieronymus Bosch Bussunda: a Vida do Casseta >
Pieter Bruegel
autor: Larry Silver
editora: Abbeville Press Publishers
tradutor: em inglês

compartilhe

     

você também pode gostar

Resenhas

Monet

Resenhas

Hopper | Le catalogue de L'Exposition

Resenhas

David Hockney: A Bigger Picture