Livros > Resenhas

Norwegian Wood

Não preciso apresentar Haruki Murakami, principalmente para aqueles que acompanham o site Bons Livros Para Ler. Mas, se você está visitando o site pela primeira vez, basta usar a ferramenta de pesquisa que verá que já resenhamos alguns livros desse autor. Infelizmente, não temos a resenha de “1Q84”. Quando a trilogia desse livro foi lançada, somente os dois primeiros livros foram lidos. O terceiro demorou quase um semestre para chegar ao Brasil. A consequência é que até hoje não completei a leitura. E essa justificativa eu já dei em outras resenhas de livros do autor. Aprendi que nunca mais comprarei uma trilogia quando ela estiver incompleta. Mas vivendo e aprendendo.

O livro de que falaremos hoje chama-se “Norwegian Wood”. O título é baseado em uma canção dos Beatles, uma linda canção para uma história que começa em um aeroporto de Hamburgo, onde essa música está sendo executada por uma banda cover instrumental. E foi a partir daí que Toru (o narrador do livro) começa a refletir sobre sua vida nos anos 60.

Essa música dos Beatles descreve um caso extraconjugal vivenciado por John Lennon. A canção também apresenta fortemente cítaras indianas, bastante melancólicas, e é conhecida por suas referências à espiritualidade oriental. Baseando-se na música para o título do romance, Murakami empresta ao livro uma sensação de reminiscência que permeia toda a história.

“Norwegian Wood” é escrito na perspectiva de primeira pessoa e pontuado por cartas de três personagens: Naoko, Reiko e Midori. Toru Watanabe é o narrador dessa história, dando-nos a impressão que o autor ( Haruki MuraKami) vocaliza a sua experiência através desse personagem. O leitor experimenta o isolamento e a dor do narrador.

Em 1968, Toru Watanabe tinha 18 anos, recém-chegado a Tóquio e vivia em um complexo de dormitórios de estudantes na universidade. Os prédios, segundo o narrador, davam a impressão de serem prisões, pois todos os prédios eram residências estudantis exclusivas para o sexo masculino, criando uma atmosfera de cigarros, café e cervejas. Seu colega de quarto, cujo apelido era “Nazista” devido ao senso de limpeza fanática, era o contraponto do ambiente de pouco asseio entre seus pares.

As revoltas estudantis da década de 60 respingaram no Japão também, e Murakami parece conhecer muito bem o processo. Era uma época em que o Japão adota o modo de vida ocidental, uma época em que as pessoas ouviam Bill Evans, liam Thomas Mann, bebiam muito café. O autor vocaliza Toru Watanabe de 37 anos para contar o período de faculdade, os desapegos emocionais, os tumultos emocionais.

Toru descreve seus anos de faculdade sempre como algo opressivo. Para isso, inventava rotinas para escapar do tédio da universidade. Desde o início, o romance é enquadrado como memória: dolorosamente o narrador relembra os momentos vividos com a jovem Naoko.

Essa experiência musical (Norwegian Wood), leva Toru a relembrar suas dores que estranhamente estavam ausentes nele, há anos. A memória é um dos aspectos centrais nessa história em que os afetos unem todos os personagens.

Vamos a história?

Toru Watanabe cresceu em Kobi, no Japão. Seu melhor amigo, Kizuki, e a namorada, Naoko, fazem parte do seu círculo de amigos. Todos estavam felizes, mas a tranquilidade foi abalada pelo suicídio inesperado de Kizuki, quando este completava dezessete anos. Toru percebe, através da morte de Kizuki, que a morte é uma parte da vida. Sua proximidade com a morte o separa dos outros.

Toru e seus poucos amigos ficaram afetados e abalados pelo suicídio inesperado de Kizuki. Ele sente-se afetado pela morte do amigo a ponto de lembrar do amigo em todos lugares que vê. Naoko, suaa namorada, sente a morte como se tivesse perdido a sua alma gêmea. Naoko decide-se pela universidade de Tóquio, mas em seu aniversário de vinte anos, após uma noite de sexo, ela deixa um bilhete explicando sua ida para um sanatório, a fim de se recuperar de problemas psicológicos que estava vivendo.

Seu problema mental está relacionado com a incapacidade de se comunicar. Ela não consegue expressar o que sente e as coisas que são importantes para ela. Aos poucos, ela vai perdendo a capacidade de escrever. Ela se envolve em seu mundo interior, em seus problemas e suas dificuldades. Seu isolamento tem um preço alto a todos aqueles que a acompanhavam.

Toru conhece a colega de quarto de sanatório de Naoko, uma musicista chamada Reiko, e os três rapidamente se tornam muito próximos. É através da orientação madura de Reiko que Naoko e Toru são capazes de se tornarem íntimos. Toru promete a Naoko que continuará a amá-la, mas acaba vendo-se distraído na faculdade depois de um encontro casual com uma garota chamada Midori.

Alguns meses se passaram sem que Naoko escrevesse uma carta no sanatório onde vivia, nas montanhas perto de Kioto. Esse sanatório claramente é uma alusão à obra-prima de Thomas Mann, “A Montanha Mágica”, de 1924. (Resenhado aqui no site). Nesse romance ocorrem várias interações curiosas entre um grupo de pacientes representativos dos cidadãos da Europa pré-guerra em um sanatório em Davos.)

É nesse sanatório o lugar onde ela tentava unir as almas desmembradas, ou seja, sua alma, a de Kizuri e a de Toru. Mas, à medida que o tempo vai passando, é Toru que vai se dividir em dois: metade dele esperando pela recuperação de Naoko, a outra metade iniciando uma nova amizade com uma colega de classe chamada Midori.

Ao contrário de Naoko, Midori é uma garota vibrante, solar, que usa minissaia, que poderíamos chamar, nos dias de hoje, de “descolada”. Ela o ajuda a puxá-lo para fora daquele mundo interiorizado em que habitava. Os dois expressam um carinho imenso um pelo outro, mas Midori concorda em deixar Toru resolver seus sentimentos por Naoko.

Podemos destacar alguns temas de “Norwegian Wood”. Um deles é o equilíbrio entre a vida e a morte. Dois personagens escolhem a morte. Isso força os personagens sobreviventes a examinar suas vidas e as decisões que tomam. A escrita de Haruki Murakami é muito eficaz, e a tradução de Jefferson José Teixeira é primorosa. Fico por aqui com a certeza absoluta que eu estou indicando um livraço que merece um lugar de honra na sua estante.


Data: 25 setembro 2018 | Tags: Romance


< Dezamores Amor Liquido >
Norwegian Wood
autor: Haruki Murakami
tradutor: Jefferson José Teixeira

compartilhe

     

você também pode gostar

Resenhas

Os imperfeccionistas

Resenhas

Memórias de um Triste Futuro

Resenhas

Dezamores