Livros > Resenhas

Mark Rothko

Hoje falaremos sobre um dos maiores pintores do século XX: Mark Rothko, nascido em 1903, em Dvinsk, Rússia. Imigrou para os EUA aos dez anos de idade, levando consigo a sua educação talmúdica e suas memórias de pogroms e perseguição na Rússia. Sua integração na sociedade americana não foi algo fácil. Sofreu o antissemitismo na pele quando estudou em Yale. Quando abandonou Yale, tomou a decisão mais acertada na sua vida: decidiu se tornar artista. Essa decisão o levou a uma nova fase em sua vida, tornando-se uma figura central na luta social dos artistas americanos. Passou por várias metamorfoses artísticas e beneficiou a transformação do mundo artístico nos EUA. E ao fazê-lo ele deu a sua assinatura artística, tornando-se um dos mais importantes artistas na cena americana e do mundo.

Quando ouvimos falar em seu nome, o que nos vem à mente são as telas totalmente abstratas dividas em retângulos luminosos de cor que parecem flutuar no espaço ilusório. Rothko passou por muitos estilos artísticos, e foi fortemente influenciado perla filosofia de Nietzsche, pela mitologia e a filosofia, e sua herança judaica-russa.

A arte de Rothko sempre esteve imbuída de um conteúdo fortemente emocional, que ele articulou através de uma variedade de estilos que evoluíram da pintura figurativa para a arte abstrata. Suas telas abstratas foram pintadas entre a década de 1950 e 1970. Foi essa fase que o tornou um artista conhecido e admirado e lhe deram a fama eterna.

No entanto, antes disso, em 1929, Rothko começou a ensinar a crianças na Academia Centro do Brooklyn Jewish Center, cargo que manteve por mais de 20 anos. Nesse período, Rothko pintou principalmente cenas de rua e seus interiores. No início de sua vida como artista, as obras dele apresentavam várias cenas e imagens do movimentado estilo de vida urbano. Suas pinturas também exalam algum mistério, emoções intensas e isolamento, como nas cenas do metrô, em que passageiros sem rostos descem as escadas contra fundos vazios.

Rothko parece querer tirar as entranhas de Nova York para exibir a qualquer um que possa observá-las de fora, através de uma visão atemporal e abstrata; o simbolismo e a centralidade do humano já determinam seus quadros, o drama que dominará seu formato mais característico subjacente na forma de alinhamento expressionista. 

Esse sentimento de empatia em sua representação artística começa a surgir nas décadas de 1920 e 1930, anos em que ele pinta quadros de paisagens urbanas, preferencialmente o metrô, com figuras isoladas solitárias. 

Essa pintura retrata os nova-iorquinos isolados, presos em seus próprios mundos individuais.

Essas pinturas do metrô “permitiram que ele se concentrasse nas horizontais e verticais, tratando as figuras como formas altas, finas e em forma de bastão”, de acordo com a legenda que acompanha uma das pinturas no site do virtual Museu Histórico Ambiente Urbano.

Mark Rothko, Metro – Fantasia subterrânea (tradução livre)

Após a Segunda Guerra Mundial, Rothko começou a apresentar imagens de sobrevivência e morte por causa das situações que prevaleceram na época da guerra. Algumas de suas pinturas incluíam conceitos enraizados em várias religiões e temas místicos antigos.

E havia os quadros de Rothko que, depois de 1938, deram um salto veloz desse estilo para o surrealismo, usando imagens que parecem organismos vivos extraídas de – entre inúmeras fontes – ciência, mitologia, arqueologia e descobertas freudianas sobre o inconsciente. O movimento surrealista na Europa e seus emigrantes de Nova York foram extremamente influentes para Rothko. As monstruosidades da Segunda Guerra Mundial inspiraram uma fuga para o refúgio dos sonhos e o passado mítico.

Tentáculos da Memória

A imagem seguinte mostra duas criaturas dançando entre o mar e o céu, cercadas por arabescos, espirais e listras. As formas "não têm associação direta com nenhuma experiência visível em particular, mas nelas se reconhece o princípio e a paixão dos organismos", disse Rothko. Para ele, a arte era "uma aventura em um mundo desconhecido"; como os surrealistas antes dele, Rothko olhou para dentro, para sua própria mente inconsciente, em busca de inspiração e material para seu trabalho.

Redemoinho lento à beira do mar

Figuras expressionistas se tornarão cada vez mais violentas para alcançar uma emoção mais intensa. Rothko está lentamente mutilando as figuras até que a decomposição seja tal que suas imagens se tornem relatos. Esse processo de convulsão acontece intimamente ligado a eventos históricos: durante o desenvolvimento da Segunda Guerra Mundial, os artistas da Escola de Nova York assumem o papel de liderança da vanguarda parisiense nas décadas anteriores e inclinam sua visão artística para responder às perguntas de homem desolado em tempos de crise.

O Presságio da Águia, 1942 [fragmento]

Novamente, o drama é servido: para Rothko, os anos entre 1941 e 1946 significam a exploração de míticas, religiosas e alusões à origem e à morte. Despojado da figuração que Rothko pinta ditada pelo inconsciente, produz imagens oníricas que, embora sejam direcionadas à abstração, devem enfatizar seus temas, o trágico sentido da vida. 

Temas mitológicos, como Édipo ou Antígona e Orestes de Ésquilo e temas judaicos cristãos, como o Getêmani.

Rothko assume, no início da década de 1940, a missão de criar uma mitologia que retornaria ao homem, seus ritos e sentimentos mais arcaicos. Afinal, eles se propuseram a reconstruir o mito, aquelas verdades que consideravam invariáveis ​​ao longo da história, que habitavam o interior dos homens e tinham um nome desde a tragédia grega. Tratava-se de comunicar sem intervenção das implicações sociais com o centro emocional humano, uma comunicação sensível direta ao inconsciente. A fonte de inspiração foi o surrealismo europeu, que chegou aos EUA através de europeus emigrados e artistas americanos que estudaram na Europa. O surrealismo ofereceu aos nova-iorquinos uma nova liberdade artística; o uso do automatismo e do acaso era o canal que liberava os impulsos internos.

Rothko construiu mitos a partir da matéria pictórica. No entanto, gradualmente, ele abandona os temas mitológicos e a estética de linhagem surrealista. A partir de 1947, sua abstração se torna mais lírica e simbólica até chegar à linguagem de suas composições clássicas em 1949. Durante esse período de transição, ele faz a série de multiformes, obras que escapam do uso de signos, e começa a criar a área de transcendência, que culminará nas amplas áreas clássicas de cores, que serão recriadas repetidamente até o final de sua carreira artística e vital. Durante todo esse tempo, a forma mudou, mas o conceito de mito não desapareceu.

O fato é que Rothko encontrou no início dos anos 1950 sua forma mais autêntica de expressão interior para concentrar sua visão do drama humano. O espectador receberá sua meditação como uma experiência mística, como um ritual religioso e não estético. Rothko sempre insistia que sua pintura em nenhum caso fosse reduzida à beleza ornamental destacada pelas qualidades de suas cores, mas algo além. Quando fixamos o olhar em sua pintura, é como se entrássemos em um portal, para uma outra realidade.

Os movimentos artísticos da primeira metade do século XX sentem a necessidade de abandonar um mundo obcecado por cientificismo e objetividade. O plano da transcendência desapareceu de todos os horizontes. Rothko rejeita qualquer identificação com o passado religioso da história, mas busca o elemento trans-histórico da mesma tradição. É por isso que alguns artistas e escritores acabam reconhecendo no misticismo uma referência inevitável para compreensão da dimensão espiritual do homem moderno.

Azul, verde e marrom de 1952

Definitivamente, a criação do mito não possui caráter religioso no sentido tradicional da palavra, mas supõe a estrutura adequada para recuperar a reflexão e estabelecer o diálogo espiritual com o ser contemporâneo. Suas pinturas passarão de uma fase em que cores intensas e intensas predominam para outra caracterizada por tons escuros.

Fico por aqui e indico o livro desse artista genial, Mark Rothko, da Editora Thames & Hudson, como um livro que merece um lugar de destaque na sua mesa central. Livraço!


Data: 20 dezembro 2019 | Tags: Arte


< Guerra e Spray Antônio: O Primeiro dia da morte de um homem >
Mark Rothko
autor: Diane Waldman
editora: Thames & Hudson

compartilhe

     

você também pode gostar

Resenhas

O Universo. Os Deuses. Os Homens Mitos gregos

Resenhas

Hieronymus Bosch

Resenhas

Pieter Bruegel