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Dias Perfeitos

Para aqueles que ainda não conhecem o Raphael Montes, fica uma dica: precisam conhecer. Carioca, advogado, 24 anos, finalista em diversos prêmios, dentre eles, o prêmio Machado de Assis, além, de ver seus contos publicados pela revista americana “Queen’s Mystery Magazine” e diversos pela revista Playboy. Possuidor de currículo de gente grande. Isso sem falar nas profecias do famoso escritor de suspense Scott Turow, conhecido do grande público brasileiro, que prevê que a carreira desse jovem escritor chegará à cena mundial como um dos maiores escritores do gênero muito mais cedo do que a gente pensa. O que concordo plenamente.

Tive uma surpresa agradável quando acabei de ler “Dias Perfeitos” de Raphael Montes. Para aqueles que gostam de um suspense perturbador, está feito o convite. O livro te leva às trevas dos dias que podemos chamar de “perfeitos”. Da primeira à última página o romance prende. E fique certo que vai surpreender. O romance é factível. Nisso reside o lado negro da força, ou seja, da história. Convido você, leitor, a ler a epígrafe de Nietzsche citado pelo autor. Isso já será um começo para sentir de quem estamos falando.

“Há sempre alguma loucura no amor. Mas também há sempre alguma razão na loucura.”

Quando pensamos em psicopatas temos a tendência a associar a personagens como aos do seriado “True Detective”, por exemplo, onde um psicopata movido a religião e maus tratos se torna um serial killer com tudo a que tem direito em termos de rituais de crueldade.

Mas, ao contrário do que podemos pensar, psicopatas, segundo a médica psiquiatra Ana Beatriz B. Silva, não estão associados à violência. E em sua grande maioria não são necessariamente assassinos e podem permanecer por muito tempo sem que sejam descobertos.

Seus atos criminosos não têm ligações com mentes adoecidas, mas algo mais sutil, como por exemplo, raciocínios frios e calculistas, combinado com uma total incapacidade de tratar as outras pessoas como seres humanos, além de serem manipuladores vorazes. Não são loucos e nem sofrem de alucinações mentais. No entanto, são seres desprovidos de consciência e, portanto, destituídos do senso de responsabilidade ética, que é a base essencial das relações emocionais. São capazes de matar? Sem a menor dúvida. Matam a sangue frio sem medo e arrependimento. E são pessoas comuns, dessas que podemos encontrar em um churrasco entre amigos.

"Enxergava Clarice como um diamante bruto. Todo relacionamento pressupõe troca, um escambo de favores, de maneira que os dois polos se seduzam mutuamente, relegados às próprias surpresas". (p. 56)

Vamos à história? Um estudante de medicina, (seu nome é Téo, Teodoro), um desses rapazes que toda mãe gostaria de ter como genro, divide seu tempo cuidando de sua mãe paraplégica, vítima de um acidente que acabou matando seu pai. Uma mãe que tinha em seu cachorro, Sansão, o seu grande amigo. Mas tudo parece acontecer dentro de uma normalidade absoluta, e diríamos até dentro de um clima de doação do protagonista. Podemos notar que em sua vida de médico o mundo é visto de uma forma bem peculiar, principalmente nas aulas de anatomia.

Um solitário que não incomoda, mas que observa o mundo ao seu redor, e dessa vida encurralada e solitária tem suas opiniões ortodoxas sobre drogas, além de ser um homofóbico convicto e religioso heterodoxo.

A vida seguia dentro do mais absoluto tédio quando sua mãe (contra a vontade de Téo) pede que ele a leve a um churrasco, até que conhece Clarice, uma garota de 24 anos, estudante de história da arte na UERJ, descolada, livre para experimentar todas as loucuras da vida e que tem na cabeça uma ideia para escrever um roteiro. Uma história próxima ao filme Thelma e Louise. Mas no seu roteiro seria acrescido, ela, Clarice, todas à procura de novas experiências.Uma garota com um perfil que, como poderíamos dizer, assim... meio perdida. Mas como diz uma música de Fausto Fawcett: “você mulher perdida é a mulher mais procurada.”

Téo fica obcecado por Clarice. Assim como faz com seus cadáveres na aula de anatomia, Téo quer dissecar Clarice. A forma de encarar a vida dessa menina, livre sexualmente, e ainda com um romance meio controverso com um violinista chamado Breno, faz com que a aproximação de Téo com Clarice seja algo doentio. Com a calma de um psicopata, planeja seus atos com a mais pura frieza, e justifica seus atos apelando para uma lógica também doentia, mas brilhante.

É a partir desse momento que essa aproximação ganha dramaticidade e o livro vai se tornando viciante. Um sequestro planejado com todo requinte de um homem que sabe pensar friamente seus próximos passos, e sabe se impor psicologicamente à sua presa. Sabe que pode levar até o fim com muita lógica suas obsessões. E para isso cria para si argumentos absolutamente racionais. Afinal, ele amava Clarice e precisava ser amado. Qual o problema nisso? Ele só quer mostrar a Clarice o seu amor e sua capacidade de amar, ele sonha com “dias perfeitos” a seu lado.

O livro nos leva a cenários paradisíacos, rodeado por estranhezas e personagens sombrios. Um suspense perturbador. Mas não fiquem pensando que Clarice é algo passivo e que a história para por aí. Clarice também é uma... Como podemos chamar?... Ah! Uma espécie de “dominatrix”. Seria isso mesmo? Deixo com vocês a pergunta. Acho que o seu fascínio está por aí. Não que ela tenha consciência disso, mas algo involuntário.

E o que vai acontecer disso tudo? Bem, é hora de pegar o livro e ler. Projetar um fim de semana livre e ler em um dia. Esse livro não deve ser lido em dias de trabalho. Você pode se prejudicar frente a seu chefe, e o seu dia pode não ser perfeito. Portanto recomendo esse livro com a certeza de que o leitor que gosta do gênero suspense não vai se decepcionar. Scott Turow, um dos Papas do suspense, recomendou. E eu como livreiro e leitor também recomendo. “Dias Perfeitos” de Raphael Montes é um livro que merece um lugar em sua estante.


Data: 08 agosto 2016 | Tags: Suspense


< O horror da guerra A Lenda do Santo Beberrão >
Dias Perfeitos
autor: Raphael Montes
editora: Companhia das Letras

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