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Banksy: Por detrás das Paredes

Banksy é uma lenda na arte de rua. Todos já viram as suas obras de uma forma ou de outra. Uns com a felicidade de vê-las ao vivo nas ruas da Inglaterra, outros por livro, jornais. No meu caso, eu assisti no YouTube ao documentário “Banksy: Exit Through the Gift Shop” (Saída Pela Porta de Presentes), de 2011, que foi indicado ao Oscar. Não conhecia sua história. Conhecia seu trabalho através de um livro da Intrínseca chamado “Banksy –  Guerra e Spray”. E agora li uma outra biografia não autorizada que nos oferece uma pequena amostra de um sujeito anônimo que é ao mesmo tempo onipresente nas ruas, online e até presente em museus.

O nome Banksy é uma derivação de vários nomes que antecederam o nome original. Um deles era Robin Banksy que parecia um estilo gangster, mas ele não gostou de ser visto como um, até que chegou à sua marca definitiva, Banksy, que era mais fácil de recordar.

Will Ellsworth-Jones (o autor) nos leva a uma viagem desde as suas origens como artista e, ao mesmo tempo, em uma atitude muito nobre, recusa-se a revelar a sua identidade. Uma biografia com muitas informações sobre esse artista, grafiteiro, ativista, provocador universal e que entrou em 2010 para a lista das cem pessoas, segundo a revista Time, mais influentes do mundo, juntamente com Lula, Barack Obama, Steve Jobs, Lady Gaga, Elon Musk, Ophra Winfrey, entre outros. A foto que ele ofereceu para a revista Time foi com um saco de papel na cabeça. O motivo desse anonimato tem a sua razão de ser , segundo o autor:

“ Ele alega que precisa desse anonimato para se proteger da lei e da ordem. Isso já foi verdade, mas, a essa altura de sua carreira, para a maioria das cidades um novo Banksy numa parede seria muito bem-vindo. A discussão seria sobre a forma de cuidar dele, e não sobre como trancafiar o responsável” ( pag1)

Banksy é um enigma. Para uns, um mago do marketing; para outros, uma mistura de revolucionário inteligente e artista de ponta;  para outros, é considerado um vendido. Bem, o seu trabalho rende milhões  de dólares nas casas de leilões, da Grã Bretanha e da América. Mas as críticas de um artista acusado de ser um  vendido têm um alto percentual tóxico de sentimentos derivados da inveja. Normal, perfeitamente humano. Nada que nos provoque espanto. Mas uma coisa é certa: sem Banksy a arte de rua não teria sido tão valorizada.

Numa entrevista enviada por e-mail para divulgar o seu filme Exit Through the Gift, Banksy diz o seguinte:

“Há toda uma nova audiência lá fora, e nunca foi tão fácil vender para ela, especialmente em níveis mais baixos. Você não tem que cursar uma faculdade, carregar para cima e pra baixo o seu portfólio, enviar transparências pelo correio para galerias esnobes nem ir para cama com alguém influente. Tudo o que você precisa agora é de algumas ideias e uma conexão de banda larga. Essa é a primeira vez que o mundo essencialmente burguês da arte está ao alcance do povo. Temos que fazer valer essa oportunidade.” ( pág. 4)

O filme, que ele financiou sozinho, foi um grande sucesso. A bilheteria americana rendeu quase 3,3 milhões de dólares. Uma coisa é certa: Banksy não perdeu dinheiro. O documentário conta a história de Thierry Guetta (Mr. Braisnwash), um imigrante francês em Los Angeles que resolveu filmar uma série de artistas de rua trabalhando. Entre eles, Banksy. A história é em grande parte retratada por Banksy com o rosto obscurecido e a voz alterada para preservar o seu anonimato.

Banksy reclamou por e-mail:

“Eu tenho uma grande equipe pequena, mas vou ser sincero – eles odeiam essa porra desse filme. Não importa se o filme funciona, eles sentem muito fortemente que Mr Brainwash não merece toda atenção dispensada. A maioria dos artistas de rua sente a mesma coisa. O filme me deixou extremamente impopular em minha comunidade” ( pág. 286)

Ativo desde a década de 1990, sua arte é uma combinação de humor e irreverência, um comentarista social, com um humor de um grande cartunista, uma curiosa mistura de revolucionário inteligente e artista de vanguarda, suas obras  incluem ratos dentuços, mostrando cartazes, meninas abraçando bombas, como ursinhos de pelúcia e policiais se beijando. Banksy  vive escondido em um saco de papel na cabeça ou, em um e-mail, ele controla sua narrativa de uma forma como poucos.

A história de Banksy, segundo Will Ellsorth-Jones, começou em 1974 quando nasceu em Bristol, Inglaterra. Nesse período, Bristol era o centro de um movimento animado da cena do grafite na Inglaterra. As guerras noturnas entre jovens armados com latas de tintas de aerosol e a polícia que queria prendê-los por desfigurar propriedades. Barton Hill um bairro pobre de Bristol onde essa cultura do grafite nasceu e cresceu.

 O autor explora a estética e as convenções do grafite incluindo  diferentes estilos de letras, o uso de tags (assinaturas) e a importância da localização e da visibilidade. Ele também discute o grafite como algo criminalizado e combatido pelas autoridades, levando uma dinâmica de gato e rato, entre artistas e policiais.

O autor conta a trajetória de Banksy,  como foi a passagem de tags e throw ups,  que são tipos de grafites para produções mais elaboradas e figurativas, frequentemente usando estêncil (moldes vazados) para agilizar o processo de execução e evitar ser preso pela polícia. Vamos dar a diferença entre tags, throw up , 3D e estêncil

Tags: São aquelas assinaturas estilizadas, geralmente rápidas, simples e com letras legíveis. Geralmente são feitas rapidamente, muitas vezes em locais de difícil acesso. O objetivo é marcar território e divulgar o nome do artista.

Throw-ups:

É um outro estilo de grafite mais elaborado que a Tag. As letras têm formas de bolhas, são grandes e coloridas. Essas demandam mais tempo, são mais impactantes e atraentes.

Um exemplo de Grafite em 3 D. O artista francês Scaf explora desenhos em locais abandonados na cidade, como casarões e mansões. Nesse 3 D temos a sensação de um animal saindo da parede.

Banksy utiliza o estêncil. E o que vem a ser essa técnica? É um método que permite a replicação rápida e precisa de imagens através de uma superfície recortada. Banksy começa sempre desenhando a arte que ele deseja expor. Para isso, ele cria um material de acetato ou papel-cartão. Em seguida recorta as partes do desenho que devem ser pintadas, criando um negativo da imagem. Na hora de criar a pichação, o estêncil é posicionado na superfície desejada, como um muro. A tinta spray é aplicada por cima do estêncil, preenchendo as áreas recortadas e transferindo a imagem para a parede.

Estêncil

O grafite exerceu, segundo o autor, um poder redentor para muitos:

“Quem fez isso e pra quê? Mas o que mais me surpreendeu ao conversar com grafiteiros – e não os Banksy da vida, mas aqueles um pouco mais abaixo da escada – é o poder redentor que as vezes o grafite  possui. O fato de haver situações  em que ele traz esperança e até mesmo uma vida para pessoas – quase sempre garotos e jovens adultos – que não tinham nenhuma perspectiva até descobrirem o entusiasmo e a habilidade de grafitar nas ruas.” ( pág. 7)

Para estes artistas, o trabalho em si era a emoção, e Banksy nunca se arrependeu realmente do desaparecimento do seu trabalho (às vezes feito em apenas duas horas e às vezes depois de alguns dias para que outro artista desenhasse  por cima).

Muitos pontos são abordados no livro, como a mercantilização da arte de rua, a relação de Banksy com o mercado de arte. E as contradições de um artista que critica o capitalismo, mas tem suas obras vendidas por milhões de dólares.

Seu trabalho cresceu a partir da cena underground de Bristol, que envolveu colaborações de artistas e músicos. Ele diz que se inspirou no artista 3D (apelido de Robert Del Naja), um famoso grafiteiro e membro do grupo de Bristol, conhecido como The Wild Brunch (O grupo Selvagem), fundador da banda Massive Attack, e Blek le Rat, que foi o pioneiro do estêncil art (o estilo de Banksy), e grafiteiros como Shepard Fairey, conhecido pelo estilo subversivo, e Keith Haring, artista de rua americano que utilizava imagens simples e mensagens fortes.

Alguns momentos notáveis de Banksy, quando ele pendurou suas próprias obras em museus famosos, incluindo o Museu de Tate Galery em Londres e o Museu de arte moderna de Nova York,  sem ser detectado. Essas ações ajudavam a estabelecer a reputação  de Banksy. Em outubro de 2003 e maio de 2005, Banksy visitou alguns museus mais conceituados de Londres e Nova York para expor algumas de suas obras. Cada obra tinha uma mensagem muito específica.

Banksy entrou na Tate Callery disfarçado e colou uma de suas próprias criações em um espaço vago em uma das paredes da galeria. Ele colocou a sua pintura que dizia: “Crimewatch UK Has Ruined the Countryside For All of Us”. O trabalho é inspirado na resina de Cannabis e na televisão. Ele não apenas pendurou o quadro, como também filmou:

“ Apesar de permanecer incógnito, Banksy declarou com satisfação aos jornais que relataram a história. “ Muitas vezes as pessoas perguntam se grafite é arte. Bom deve ser, agora que já foi colocada na fodida galeria Tate” Ele acrescentou sugestivamente: “ Passar realmente pelo processo de ter um quadro selecionado deve ser muito chato. É muito mais divertido ir lá e colocar alguma coisa sua na parede. O negócio todo é eliminar os intermediários, ou o curador, no caso da Tate. “ Mas o negócio todo foi realmente mais do que isso – foi um golpe publicitário que funcionou maravilhosamente. E se deu certo na Tate, por que não experimentar em outros lugares?” ( pág. 12)

Imagens do feito correram pela internet incipiente na época e alimentaram a curiosidade sobre o trabalho de Banksy – que, nos meses seguintes, repetiu a estratégia em galerias de Londres, Paris e Nova York.

O livro fornece um contexto importante para entender a obra de Banksy e seu lugar na história mais ampla da arte urbana. Mostra como ele emergiu de uma arte estabelecida, e ajudou a levar essa tradição para novas direções, abrindo caminho para seu impacto e reconhecimento globais.

Segundo Ellsworth-Jones, existem grafites e grafites. Qualquer pessoa já deve ter visto rabiscos nas paredes, alguns deles sem sentido algum, chegam a ser irritantes, apenas para deixarem suas marcas colocando seus nomes como em uma exposição. Contudo existem grafites mais elaborados:

“nos quais, o importante é a fluência do trabalho, o ritmo o equilíbrio, as silhuetas intrincadas das letras, o espaço entre cada letra – as cores do contorno, as cores dentro do contorno, as cores de fundo. Este é só o começo da lista. O resultado final pode ser considerado tão irritante como o rabisco simples, mas não são irrefletidos, são muito cuidadosamente pensados meticulosos, expressivos são numa palavra, arte. E o que os de fora não percebem é que lá no fundo de cada obra há um nome. Essencialmente um pseudônimo é assumido, pois obviamente não há razão para fugir da polícia se você deixa a assinatura verdadeira na parede.” ( pág. 42)

Uma vez pediram a Banksy para definir o grafite e ele definiu da seguinte forma:

“Eu amo o grafite. Eu amo a palavra grafite. Algumas palavras ficam irritadas com ele, mas acho que estão lutando uma batalha perdida. Grafite é incrível... Faço pinturas normais se tenho ideias muito complexas ou ofensivas para estar nas ruas, mas se eu deixasse de fazer grafite seria o meu fim. Eu me sentiria alguém que faz artesanato, e não um verdadeiro artista.” (pág. 46)

A arte performática de Banksy levou a sua arte aos principais museus do mundo, incluindo o Louvre. Lá ele conseguiu instalar uma imagem da Mona Lisa com um adesivo colado de rosto sorridente:

Na cidade de Nova York, ele anexou sub-repticiamente um pequeno retrato de uma mulher usando uma máscara de gás. no Metropolitan Museum of Art.

Fico por aqui. Devo dizer que “Banksy: Por Detrás Das Paredes”, de Will Ellsworth-Jones, mostra um conhecimento e uma profundidade não só sobre Banksy, mas sobre arte em geral. É um livro saboroso, uma jornada em um mundo totalmente desconhecido para mim.  E para o próprio autor, que termina dizendo:

“Quando comecei a pesquisa para este livro, eu pensava em Banksy como uma espécie de vândalo atacado pela sorte: divertido, um pouco misterioso:, e em geral uma força do bem, aparecendo nas paredes de todos os lugares e sumindo antes que alguém pudesse encontrá-lo. Agora penso nele como um elemento muito mais permanente; muito talentoso e muito inteligente, no auge do emergente movimento arte de rua, embora ele pinte algumas imagens que vão do estúdio direto aos colecionadores, sem passar pelas ruas. Ele é muito mais rico que eu imaginava, muito mais controlador – certamente não mais um vândalo sortudo. Perguntaram-me uma vez se Banksy gostaria deste livro; a resposta da qual tenho certeza ´[e não, pois que quer que diga dele aqui, o fato é que este é um livro que Banksy não controlou.” ( pág. 302)

E quanto mais fundo você encara esse mundo do grafite, mais fascinante tudo parece. Um livro que merece um lugar de “HONRA” na sua estante.


Data: 15 abril 2024 | Tags: Biografias


< Questão Feminina Sonhos de uma noite de Verão >
Banksy: Por detrás das Paredes
autor: Will Ellsworth – Jones
editora: Nossa Cultura
tradutor: Ivan Justen Santana

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