A Loura
O enredo de “Ulisses”, paródia de Homero, de James Joyce que é considerada um marco da literatura mundial, se desenrola em um só dia em Dublin, capital da Irlanda, onde os acontecimentos da narrativa acontecem. Parodiando Odisseu (Ulisses) através do seu personagem Leopold Bloom, Penélope e Telêmaco, sua esposa Molly Bloom e Stephen Dedalus, o livro explora diversas áreas dublinenses e sua monotonia em um livro enorme. Bloom, como Ulisses de Homero, precisa superar numerosos obstáculos para voltar ao seu apartamento na Rua Eccles, onde sua mulher o espera.
Calma, minha gente! Não estou aqui apresentando Ulisses de James Joyce. Venho falar de Duane Swierczynski autor do Thriller “A Loura”. Não pensem vocês que o nome desse autor é escrito de uma forma espontânea e fácil, e simples. É na base do control c, control v. Afinal, a quantidade de consoantes e a ausência de vogais não permitem que eu cite o referido autor sem cola.
Vocês já conhecem o autor. Ele está aqui no blog com outro thriller “Indenização” que eu recomendo sem pestanejar. Bem, dito tudo isso, algumas perguntas já começarão a ser feitas. Como por exemplo, porque iniciar esse livro citando James Joyce. Na verdade a única semelhança existente entre as obras reside no tempo. Ambas acontecem em um dia, só que em horários diferentes. “A Loura” começa às 21h13min e termina na noite seguinte às 21h57min. A Odisseia de Ulisses de James Joyce começa por volta das oito da manhã e termina em algum ponto as duas de madrugada do dia seguinte. Portanto, mãos à obra.
O motivo da escolha desse livro é dedicado a todos aqueles que gostam de thriller para os fãs de ação, que não largarão o livro antes de juntar os pedaços dessa história e desvendar uma trama insana e ao mesmo tempo divertidíssima. Além disso, é curto sem direito a descrições das cores dos uniformes que as pessoas usam, sem descrições das árvores e dos pássaros que ali gorjeiam. Nada disso.
O livro começa com uma sequência no mínimo exótica. Uma mulher de nome Kelly White senta-se a mesa de Jack Eisley (que até aquele momento encontrava-se entediado no aeroporto pensando em se encontrar com advogado de sua mulher e discutir o divórcio) os dois conversam. Ela tenta seduzi-lo com uma conversa que transcende a um encontro inocente. Quando subitamente dispara o seguinte texto:
“Envenenei sua bebida.
- Oi?
Mmm.. acho que não.
- A loura ergueu a taça Cosmopolitan e disse:
- Saúde!” ( p. 9)
E a loura realmente envenena Jack Eisley que não acredita, mas só vai chegar à verdade depois de sofrer os danos do envenenamento, ou seja, vômitos em doses cavalares a ponto de sentirmos o estômago de Jack Eisley virar um saco vazio. Ele volta para o aeroporto na esperança de obter um antídoto para conter aquele mal estar. Seu corpo acabara de receber um memorando do seu corpo com os seguintes dizeres:
“Sim, acabamos de confirmar o fato de termos sido envenenados. Seu corpo agora está tomando as devidas providências para livrar-se do veneno. Boa sorte, parceiro, e agora mais uma vez, ao ataque!”
O veneno que Kelly colocou na bebida de Jack Eisley, na verdade, era um perigoso rastreador baseado em nanotecnologia, que a Louraça belzebu injetou em si mesma e você entenderá o porquê ao longo da narrativa. Uma estranha tecnologia produzida em microscópicos robôs que faz com que a vida dela fique sempre em perigo a menos que ela consiga manter-se o tempo inteiro, no máximo, a três metros de distância de alguém. E foi por medo dessa solidão mortal que ela toma a iniciativa de envenenar Jack Eisley e arrastá-lo para essa história. Mas ela tem o antídoto. Ela tenta confessar a Jack da necessidade dele, e que realmente precisa da presença desse anti-herói, pois está infestada de nanotecnologia em seu corpo que vai matá-la se estiver sozinha.
Mas se você pensa que o enredo é algo que se resume apenas a um thriller nanotecnológico, convido todos a mudarem suas expectativas e ampliarem um pouco mais seus conceitos sobre o livro. Sem perder muito tempo explicando a tecnologia e a ciência envolvidas na história, Duane Swierczynski parte logo para ação.
Kowalski, um funcionário ultrassecreto da Agência de Segurança Nacional, aparece na história burlando ordens e mirando cabeças de capangas da máfia que mataram sua mulher. No fundo estava fazendo hora extra sem preocupações com horas com o “V” de vingança.
“O cara, cuja cabeça estava na mira de um assassino profissional, não fazia a menor ideia de nada. Comia uma fatia de pizza sem molho (seu imbecil! Não é o molho que engorda, mas a massa e o queijo, otário) e tomava Orangina de canudo.
Aproveite a última mordida, meu amigo.
Preparar.
Dedo indicador no gatilho.
Ajustar o ângulo de forma a permitir o máximo de esguicho.
E...
E a perna de Kowalski começou a vibrar.”
Era o celular. Uma chamada de sua chefa que interrompia seu momento “lindo” de introspecção vingativa para convocá-lo a realizar uma missão. Querem saber a missão? Pois bem, direi. Mas chega, não darei mais pistas. A missão era pegar uma amostra biológica de um professor de nome Manchette que havia morrido no início daquela manhã e o departamento precisava checar algo. Vocês certamente indagarão: um pedaço de pele? Sangue? Algum pedaço do corpo para fazer testes de D.N.A. Senhores a missão era arrancar a cabeça do professor e trazê-la de preferência dentro de uma mochila Adidas, para que tudo ficasse bem natural.
Pois bem, como esse agente é um desses sujeitos cumpridores dos seus deveres, ele faz o que deve ser feito para levar a cabo sua tarefa, não importa os obstáculos. A cena em que Kowalski encontra uma serra com poder de executar a tarefa, a rota da decapitação é complicada, louca e graças a todas essas confusões traz Kowalski em contato com “A Loura” e Jack Eisley. Graças à ironia cortante e à violência estilizada com detalhes de humor negro de Duane Swierczynski.
Duane Swiercynski agarra o leitor pela garganta na primeira página, apresenta um grande problema que o protagonista terá que resolver e vira o jogo, e nós leitores cairemos na cilada do autor e quando as vinte primeiras páginas forem digeridas nos tornaremos refém da história, não conseguiremos ficar a três metros do livro, ele ficará colado em você, leitor. No final do livro a sensação que fica - principalmente para os mais sensíveis – é uma preocupação com a saúde mental daqueles que por ventura lerem esse livro. Já que as cenas de maldades beiram ao diabólico. Mas sem culpas. As cenas são estilizadas e o sangue é de mentirinha.
Duane Swiercynski já é um velho conhecido nosso. “Indenização” foi o primeiro de uma série que virá desse autor a ocupar o espaço para quem gosta de livros de muita ação. Vale muito a pena tomar contato com esse tipo de literatura. Para quem gosta de Quentin Tarantino, Frank Miller. Esse é um livro que vale a pena estar em sua estante.