Livros, livrarias, livreiros ...
24 outubro 2016 - Luis Guilherme de Beaurepaire

Hoje em dia, quando falo que sou livreiro ainda sinto um certo “O que é isso? Você vende livros?”.

Resolvi, então, que falaria sobre isso neste espaço que me dei de presente aqui no site, um espaço para falar sobre temas e assuntos outros que não sejam sobre sugestões literárias, mas que me interessam. Espero não cansá-los.

E pensando nisso, enfim, o que é um livreiro? O que é ser ou se tornar um livreiro num mundo de 140 caracteres? Estarão as livrarias no fim de suas vidas e com elas a profissão que abracei? Há espaço para livreiros neste mundo? E os livros como os concebemos hoje serão substituídos por tablets e smart-tudo? Por onde andarão livros, livreiros, livrarias e leitores daqui a 10 anos? Falamos tanto em mudanças, mas estamos preparados para elas e realmente as desejamos ou estamos indo numa “onda” sem saber onde vamos parar?

 

As perguntas são muitas e longe de mim a pretensão de respondê-las, mas podemos pensar a respeito e escrever algumas linhas para tranquilizar o intelecto na produção de perguntas.

 

Um livreiro não vende livros. Quem vende algo é vendedor ou o e-commerce. O livreiro vai além da entrega do objeto nas mãos do solicitante: ele sugere livros de acordo com a demanda e o perfil de quem o procura.

Um livreiro se forma com o tempo, através do prazer de ler e, mais tarde, com a necessidade de compartilhar, sugerir e participar das buscas alheias para encontrar um autor, um link para uma pesquisa, uma outra obra para uma tese e, quando se percebe, há um comprometimento para que o outro encontre o que deseja e uma generosidade nesse tempo dedicado a proporcionar tão inusitados encontros entre leitores e livros.

Comigo foi assim. O prazer de ler veio antes da universidade. Antes do sociólogo já havia um leitor voraz. E o leitor foi parar numa livraria onde encontrou uma profissão que “lhe caiu bem”. E tudo fez sentido.

Trabalhei na Livraria Argumento e na Livraria da Travessa. Em ambas sempre ouvia “deve ser o máximo trabalhar no meio desses livros!”. Sim, é o máximo. Livros geram assuntos, que viram conversas, debates e devaneios. Clientes quando leitores nos fazem bem e trazem novidades, animam o dia com trocas inteligentes.

E as livrarias? Sempre existirão. Porque sempre precisaremos de uma “casa”, um “teto”, um “abrigo” para nos encontrar e estabelecer as trocas tão necessárias para o desenvolvimento e a renovação de nossas ideias, além dos discursos óbvios e ditados sem procedência segura e conhecida. As livrarias estão abertas a todos e é desse espaço democrático e cultural que precisamos para estimular o pensamento e nossa capacidade de reflexão. Ler é silenciar e refletir. Sempre precisaremos disso, de alguma forma, em algum lugar. E as livrarias sempre estarão abertas para isso.

Quanto aos livros, confesso, tenho o Kindle. Comprei porque todos diziam que era ótimo e eu não conseguiria viver sem ele. Bem, instalei alguns títulos. Gostei da praticidade, até que o levei numa viagem e me vi na seguinte dúvida: “Carrego a bateria do celular ou do Kindle?”. Carreguei o celular e fiquei sem ler. Ou seja, livros sempre serão livros. Livros sempre estarão na minha estante olhando para mim, são meus, não estão “baixados”, estão no alto, à esquerda e à direita. Estão por toda parte. Neles tenho algumas dedicatórias que contam a minha história, anotações feitas com a minha letra. E alguns rabiscos também.

Sim, gosto do meu Kindle, já passamos algumas horas juntos, mas nada substituirá o prazer de ter meus livros em casa. Eu me sinto mais seguro com livros por perto. Na dúvida de ter ou não um título, eu compro. Depois troco. É mais seguro ter dois do que nenhum. Tenho problemas para administrar o espaço em casa, as estantes sempre encolhem depois de um tempo e as faxineiras reclamam da poeira. E eu pergunto: “O que posso fazer se tudo está poluído e o mundo está ficando apertado?”.

 

E quanto a nós? Nós seguiremos tentando mudar nossos hábitos e resgatando outros, numa inebriante valsa entre valores e modismos, apostas e retrocessos.

 

O mundo sempre foi assim e continuará sendo.

E existem ótimos livros sobre esse assunto.




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