O Apanhador no Campo de Centeio
O livro que de falaremos hoje se chama “O Apanhador no Campo de Centeio”, de J.D. Sallinger. Esse livro foi um sucesso editorial, foi a obra mais importante do autor. Ele nasceu em 1919 em Nova York, morou na Pensilvânia, onde estudou no College em Collegeville e, posteriormente, na Columbia University. Durante o seu tempo de universidade, trabalhou como crítico de teatro e colunista, mas infelizmente deixou a faculdade sem diploma. Enquanto serviu para o Exército americano na Segunda Guerra Mundial, como parte do Corpo de Conta-Inteligência, ele conheceu o famoso Ernest Hemingway, que na época trabalhava como correspondente de guerra e ficou fascinado com o trabalho de Salinger. A lista de livros de J.D. Salinger não é extensa; no entanto, os críticos descreveram os anos entre 1948 e 1959 como a “Era Salinger”. Ele nunca foi capaz de escrever um romance (segundo os críticos) tão bom como esse. “O Apanhador no Campo de Centeio” ficou conhecido como um romance épico.
Esse livro é tão especial que alguns críticos o veem como uma crítica social, enfatizando a desonestidade da sociedade americana durante a década de 1950. Outros apontam o aspecto psicológico do romance, especialmente no tocante à fase transitória da adolescência para a fase adulta. E acredite: existem alguns que conseguem ver no romance sub-repticiamente uma contribuição ao estudo de gênero, retratando os conflitos, normas e valores sexuais e a incerteza em relação à identidade sexual de uma pessoa durante a adolescência. Enfim, várias interpretações sobre a obra, que só aumentam o seu valor para o grande público leitor.
Existem vários tipos de interpretações sobre esse livro que nos levam a várias possibilidades de explicação sobre a história.
Antes de começar a falar sobre a história, eu gostaria de contar a minha experiência na leitura desse livro. Quando eu comecei a ler, à medida que a história ia se desenrolando, aconteceu algo que sinceramente nunca havia acontecido comigo em toda a minha vida de leitor. Eu ria em voz alta. Nunca me diverti tanto numa leitura. Quando eu acabei de ler, fui conversar com a minha esposa. Ela se espantou. Achou um livro denso, de um personagem fora da caixinha, etc. e tal. Cheguei a ponto de dizer que esse livro deveria ter influenciado o humor americano, na atualidade.
Os que leram o livro perguntariam: “Onde está esse humor”? Alguns pensamentos irrelevantes, como o dos patos no Central Park no inverno, por exemplo, me fizeram não parar de rir, à medida que lia essa autodescoberta do narrador. E são essas irrelevâncias que escondem o humor. Fizeram-me lembrar em determinado momento de Seinfeld e o seu humor sobre o nada. Todas as situações vividas pelo narrador não têm nenhuma carga dramática, mas sim irrelevâncias narradas e ao mesmo tempo vivenciadas. Mas na verdade existem outras questões que eu não tinha percebido.
Professor pergunta:
“Estudamos os egípcios de 4 de novembro a 2 de dezembro. Você mesmo escolheu os egípcios como tema de dissertação. Você se importa de ouvir o que escreveu?
- Não precisa, não, professor.
Mas ele começou a ler assim mesmo. Ninguém consegue parar um professor quando eles resolvem fazer alguma coisa.
Vão fazendo de qualquer maneira.
Os egípcios eram uma raça antiga de caucasianos que habitavam uma das regiões do norte da África.
A África como todos sabem, é o maior continente do hemisfério oriental.
Eu tinha que ficar lá sentado, ouvindo aquela baboseira toda. Era mesmo sujeira dele.
Os egípcios são extremamente interessantes para nós, nos dias de hoje, por várias razões. A ciência moderna ainda gostaria de saber quais os ingredientes secretos que os egípcios empregavam quando embrulhavam os mortos, para que seus rostos não apodrecessem ao longo dos séculos sem fim. Este interessante enigma permanece ainda no século XX, como desafio da ciência moderna.
Parou de ler e pôs a prova no colo. Eu estava começando a ficar com uma raiva danada dele. – Sua dissertação, se é que devemos chama-la assim, acaba aqui – disse ele naquela voz sarcástica. Ninguém imaginaria que um cara tão velho pudesse ser tão sarcástico e tudo. – Entretanto, você me escreveu um bilhetinho no pé de página.
- Eu sei, Professor – fui dizendo bem depressa para ver se ele não começava a ler aquillo. Mas ninguém podia fazer ele parar. O homem estava mais aceso que um buscapé.
Caro Professor Spencer (começou a ler em voz alta): Isto é tudo que sei sobre os egípcios. Não consigo me interessar muito por eles, embora suas aulas tivessem sido muito interessantes. Mas o senhor não precisa se incomodar se eu for reprovado; fui mesmo ao pau em todas as matérias,
Menos Inglês. Respeitosamente, Holden Caulfield (pg 15)
Eu e minha esposa, Paula, conversamos sobre o livro, mas ela me dizia algo totalmente o contrário do que eu havia percebido, a ponto de fazer a seguinte pergunta: “Será que eu entendi direito esse livro?”. Algo havia passado que não identifiquei? Deixei de postar essa resenha anteriormente por causa desse dilema. Pois bem, voreli o livro e continuei vendo algumas situações de humor explícitas. Mas enxerguei outros pontos importantes. Vamos ao livro?
Holden Caulfield é o narrador de 16 anos de idade em “O Apanhador do Campo de Centeio”. Ele começa dizendo que ele está em tratamento psiquiátrico, e vai se lembrando do que aconteceu com ele no último Natal. Esta história é a base de sua narrativa. Holden é um aluno da Pencey Prep School, um rapaz imaturo e irresponsável, e totalmente avessso ao estudo, mas era bom em inglês. Holden narra primeiramente a sua expulsão por ter tomado bomba em quatro das cinco matérias. Holden vai visitar seu professor de história chamado Spencer, antes de deixar a escola.
Spencer o aconselha dizendo que:
“E a vida é um jogo, meu filho. A vida é um jogo que se tem de disputar de acordo com as regras” (pg 12)
Segundo alguns críticos, não há uma figura mais polarizadora na literatura americana do que Holden Caufield, o protagonista de “O Apanhador do Campo de Centeio”, de J.D. Salinger. Algumas pessoas se identificam com Holden com tanta força que praticamente o idolatram; outras acham suas travessuras e atitudes tão egoístas e imaturas que não conseguem suportá-lo, e outras querem apenas abraçá-lo. Pessoalmente, a minha identificação com o personagem foi total, pois me lembro dos meus 16 anos e eu tinha alguns pensamentos e atitudes que me perseguem até hoje, e são muito semelhantes aos de Holden.
Quem é esse Holden Caulfield e por que ele produz reações tão diferentes nos leitores? O jovem Holden estuda (como já dissemos anteriormente) em uma escola preparatória da Pensilvânia chamada Pencey, e quase podemos dizer, sem medo de errar, que ele se encontra um pouco confuso. O romance é contado do ponto de vista de Holden:
“Se querem mesmo ouvir o que aconteceu, a primeira coisa que vão querer saber é onde nasci, como passei a porcaria da minha infância, o que meus pais faziam antes que eu nascesse, e toda essa lengalenga tipo David Copperfield.” (pg 7)
A neurose de Holden Caulfield enfatiza sua própria hesitação e ignorância em demonstrar emoção. Uma coisa fica clara: logo de início, a morte de seu irmão Allie Caulfield afeta profundamente o comportamento de Holden ao longo de sua jornada, à medida que modela sua visão emocional da vida. Enquanto relembrava a morte do seu irmão, Holden confessa:
“Eu só tinha uns treze anos, e meus pais resolveram que eu precisava ser psicanalisado e tudo, porque quebrei todas as janelas da garagem. Mas realmente acho que eles tinham razão. Dormi na garagem na noite em que ele morreu e quebrei a droga dos vidros todos com a mão, sei lá por quê. Tentei até arrebentar os vidros da camioneta que nós tínhamos naquele verão, mas essa altura da mão já estava quebrada e tudo, e não consegui. Reconheço que foi o tipo de coisa estúpida a se fazer, mas eu nem sabia direito o que estava fazendo, e vocês não conheciam Allie”. (pg 37 e pg 38)
Holden, ao invés de ficar deprimido com a morte do irmão, opta em criar uma barreira entre ele e suas emoções. Isso acaba ficando engraçado, pois, ao se negar a mostrar suas vulnerabilidades de uma maneira saudável, a neurose prevalece. Quando fala sobre seu irmão Allie, não consegue lidar com os sentimentos negativos de isolamento, o que o levará a vivenciar situações de riscos, inclusive riscos de vida. Ao omitir suas vulnerabilidades, acaba criando situações engraçadas.
A incapacidade de expressar emoções do narrador nos faz ter empatia por ele. Ao se proteger de suas emoções, Holden Caulfield se utiliza de vários subterfúgios, como, por exemplo, o uso da raiva e admiração, para produzir sentimentos e ao mesmo tempo colher humor. E ao mesmo tempo poesia, pois o título do livro é baseado no poema “Comin Thro' the Rye", do escritor escocês Robert Burns; Holden discute esse poema com sua irmã mais nova Phoebee conta a ela uma fantasia: a de que ele é um salvador de crianças brincando em um campo de Centeio, e ele as captura antes que elas caiam do penhasco. E é nesse momento em que Salinger nos diz que, atrás da incapacidade de Holden em revelar suas emoções, existe uma poesia por trás de suas ações.
Fico por aqui e indico com toda a certeza “O Apanhador do Campo de Centeio”, de J.D. Salinger, como um livro que merece um lugar de honra na sua estante.