Casados com Paris
Paula McLain, autora de “Casados com Paris”, é uma verdadeira “apaixonada” pela Geração Perdida e nos presenteia através de sua obra com uma deliciosa “possibilidade” de cenas e diálogos vividos por Hemingway e sua “turma” : Gertrude Stein, o casal Fitzgerald, Erza Pound, Sylvia Beach e tantos outros. Reforço a palavra “Possibilidade” porque o livro é um romance ficcional e não uma tese fundamentada de Mestrado ou coisa parecida - e ainda bem que é assim – com algumas licenças poéticas, Paula McLain buscou um foco diferente para falar desse período tão fascinante, buscou uma voz feminina dentro daquele cenário animado e exótico, e ela nos faz ver esse período e suas excentricidades pelos olhos e sentimentos de Hadley Richardson, a primeira esposa de Hemingway ou muito conhecida com “a esposa de Paris”.
Através de uma pesquisa primorosa, acesso às correspondências, entrevistas e registros históricos muito bem documentados, até mesmo pelo próprio Hemingway, encontramos nesta obra uma deliciosa reconstituição de época, com uma história que nos faz pensar e ouvir esta primeira mulher que esteve ao lado de um Hemingway ainda desconhecido, se atrevendo a ser escritor em uma cidade desconhecida para a qual todos convergiam a procura de algumas resposta e alguns sinais.
Existem lugares que são assim, em determinados períodos da história do mundo se tornam um ponto de convergência, para onde “todos” se dirigem. Paris foi a cidade que impulsionou a carreira de muitos artistas que marcaram "encontro" e foram para lá. E assim, ganhamos uma produção literária eclética e sensacional.
Voltando ao livro, a história começa com o encontro de Hadley e Hemingway ainda nos Estados Unidos. Somos apresentados aos seus universos, acompanhamos o início de seu relacionamento e os vemos casar e optar por Paris. Chegando lá, encontramos os primeiros contatos profissionais que abririam as portas para Ernest no ciclo literário, acompanhamos o desenrolar da vida profissional deste grande escritor e seu casamento, sua vida afetiva, seu reconhecimento profissional, suas escolhas e inevitáveis perdas.
Quando cheguei à última página e fechei o livro, confesso que senti uma saudade estranha. Saudade de uma época que não vivi, mas que seduz pelo seu brilho, exotismo e qualidade de tudo o que foi oferecido por inúmeros artistas e profissionais de outras áreas, em um mundo conturbado. Um período entre guerras. O próprio Hemingway carregava seqüelas e lembranças duras da 1ª Guerra. Mas tudo era intenso: a alegria e a dor. A vontade de viver e a certeza da morte, talvez por isso os limites tenham sido testados e ultrapassados com tanta naturalidade e a todo instante. A Europa havia saído de uma guerra que começou em 1914 e terminou em 1918, e outra começaria em 1939, muito mais dramática e avassaladora. E de alguma forma, talvez essa possibilidade estivesse no ar e tenha feito todos viverem de forma tão intensa, com entregas tão generosas e sem limites.
“Casados com Paris” apresenta os bastidores do casamento de um Hemingway tentando se firmar como escritor, com todas as suas memórias da Primeira Grande Guerra e buscas pessoais, e como esse casal se relacionava com as excentricidades de seu novo ciclo novos amigos, seus comportamentos ousados, intempestivos e a chegada do primeiro filho. Tudo isso visto e vivido por uma mulher americana que vai pontuando os contrastes e diferenças entre duas culturas que estavam mudando. Ficamos mais próximos a Hemingway e, sem dúvida alguma, ao menos para mim, “Paris é uma festa” ganhou outro sentido, ficou mais completo.
Em “Paris é uma festa”, ele escreve sobre o início de sua vida, como escritor, com Hadley e pontua em suas últimas linhas:
“Paris não tem fim, e as recordações das pessoas que lá tenham vivido são próprias, distintas umas das outras...Paris vale sempre a pena e retribui tudo aquilo que você lhe dê. Mas, nesse livro, quis retratar a Paris dos meus primeiros tempos, quando éramos muito pobres e muito felizes.”
Mas “Paris é uma festa” ficará para outro dia... assim como “Os anos loucos”, de William Wiser, ou “Shakespeare&Company”, de Sylvia Beach, “Ulisses” de James Joyces...
Agora, só tenho uma coisa a dizer: “Casados com Paris” é uma parada obrigatória. E se ao lerem o livro, sentirem uma vontade irresistível de ver ou rever “Meia- noite em Paris”, de Woody Allen, Vou entender completamente. Boa leitura!
Texto/Colaborador(a): Paula Dias