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O Homem sem doença

 

Se você está pensando em ler “O Homem sem doença”, de Arnon Grunberg, vou logo dizendo uma coisa: prepare-se para fortes emoções. Quem leu “Tirza”, do mesmo autor, sabe que as situações limites seguem rumos diferentes em ambos os livros, mas posso dizer que a atmosfera kafkiana é o pano de fundo para todas as situações.

 

O cenário do romance acontece em três países. O primeiro país é a Suíça, onde Samarendra, o protagonista da história, nasceu. O segundo país é o Iraque, especificamente na cidade de Bagdá. Na segunda parte do livro, a história acontece em Dubai. O estilo deste novo romance é típico de Arnon Grunberg. O mais típico é a ironia com a qual ele descreve eventos.

 

“O Homem sem doença” é uma análise tragicômica dos tempos em que vivemos. Com sacadas filosóficas (que ao que tudo indica recorrentes no autor, pelo menos  nesses dois livros que li, “Tirza” e “O Homem sem doença”) sempre agudas, sobre justiça, sobre humilhação, sobre uma falsa sensação de segurança, conduz o herói, Samarendra Ambani, um jovem arquiteto idealista, ingênuo, filho de pai indiano e mãe suíça, um proeminente arquiteto, a vivenciar turbulências irreparáveis quando ele é convidado a participar de uma licitação de projetos por um milionário muito estranho chamado Mr. Shakir Mahmoud Hamid para projetar uma casa de ópera em Bagdá. Convenhamos que projetar uma casa de ópera em Bagdá é uma tarefa estranha por si mesma.

 

Um homem que tinha o seu pensamento voltado apenas para arquitetura e ignorava o mundo turbulento em Bagdá e o que essa escolha trazia. O preço dessa vitória, já que seu projeto foi considerado o mais, como poderemos dizer, ”sublime” entre os concorrentes, não ocorre como esperado.  Ao chegar em Bagdá, é enviado a um hotel simplesmente imundo, comida desagradável. Sua mala é roubada e suas roupas trocadas por outras totalmente surradas. Seus seguranças não são confiáveis. Ao saber pela televisão que o Sr. Shakir Mahmoud Hamid foi morto em um ataque, Samerendra começa a entender que seu trabalho morreu junto com seu contratante.

 

Tenta entrar em contato com a Embaixada da Suíça, mas não consegue. Consegue finalmente um táxi que o leva para um posto de controle militar. Seu passaporte (para completar todos os tormentos) havia sido roubado, provavelmente pelos seguranças. Os guardas o levam a uma sala escura e o humilham com surras, quebrando o seu nariz, e mijam em cima dele, deixando marcas profundas em sua vida. Não podemos deixar de associar essas torturas com as fotos divulgadas pela mídia de americanos mijando nos corpos dos iraquianos durante a guerra contra Saddam Hussein.

 

Samerendra vai se enfraquecendo, chegando a beira do colapso, naquela sala escura quando a Cruz Vermelha aparece para ajudá-lo. E acaba sendo salvo. Não havia ninguém no Iraque que soubesse alguma coisa sobre a tal casa de ópera em Bagdá.

 

Ao chegar em sua casa na Suíça não consegue relatar o ocorrido à sua família, em especial à sua noiva Nina. O trauma o devastara. Sua noiva é descrita como uma mulher perfeita, linda e inteligente. A única coisa que não se encaixa na imagem perfeita dessa mulher é o bigode que carrega. Mas ela acaba raspando-o.

 

“O Homem sem doença” é um romance compacto que fala sobre a alienação, a segurança aparente que todos nós pensamos viver. Arnon Grunberg nos levará a superfícies absolutamente transparentes, limpas (casa de ópera, bibliotecas, respectivamente. A sede de música e literatura) para profundezas escuras do submundo (a célula, os bunkers). A mensagem do livro é de que a princípio a vida não é tão boa como parece à primeira vista.

 

Indico “O Homem sem doença”, de Arnon Grumberg, como um livro que incomoda e nos lembra o mundo kafkiano cheio de pressões psicológicas. Um livro que merece um lugar de destaque na sua estante.


Data: 10 novembro 2016 | Tags: Suspense


< A História Maravilhosa de Peter Schlemihl O Tempo dos desenraizados >
O Homem sem doença
autor: Arnon Grunberg
editora: Rádio Londres
tradutor: Mariângela Guimarães

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